Uma educadora à frente do seu tempo

sexta-feira, 16 de setembro de 2011

Mesmo não sendo a primeira experiência no magistério, uma vez que começou a lecionar no Colégio Jacobina e, na Baixada Fluminense, procurasse dar continuidade ao ensaio de escola ativa que realizara com os filhos de pescadores, em Angra dos Reis, em 1919, quando acompanhou o irmão que trabalhava na Marinha, fora ali que dera sentido a seu projeto de educação popular.

Em Angra dos Reis, improvisou apenas uma escola ao ar livre, à sombra de bambus, com mobiliário bem tosco: uma única mesa de pinho, uma cadeira e esteiras no chão. Cerca de cinquenta crianças da região com idades entre 3 e 16 anos, chegavam diariamente de canoa, ou após longa caminhada, por volta das seis, sete horas da manhã e só iam embora à noite. Partindo de seus interesses, Armanda levava-as a manipular objetos concretos: conchas, pedrinhas, folhas, frutos, retalhos de tecidos diversos, convertidos em material didático. Tentava, dessa forma, apostar na capacidade de pensar da própria criança, tomando como ponto de partida seu universo, sua experiência.

Começava então a viver o magistério como um meio de afirmação pessoal e profissional, resultante de uma vontade de atuar no mundo, provocar mudanças e conferir sentido à própria existência, num momento no qual a educação era entendida pelos intelectuais e políticos como via de regeneração da sociedade.

Naquela época, a proximidade das comemorações do Centenário da Independência, em 1922, servia de pretexto para que determinados setores se organizassem em torno da causa do combate ao analfabetismo, procurando reverter o abandono da educação popular, elevar o nível cultural das massas, retirando-as da ignorância e da apatia e desenvolvendo o espírito cívico. Constituíam-se ligas nacionalistas que procuravam aglutinar os jovens em torno da ideia de coesão e integridade nacional, do desenvolvimento do culto do heroísmo, da propagação da educação popular e do combate ao analfabetismo, que era apontado como responsável pelo atraso do país e a escola começava a ser vista como a instituição capaz de promover o progresso, desenvolver o sentimento patriótico, fixar o trabalhador no campo, aumentar a produtividade agrícola, combater as doenças, propagar os avanços da ciência, reverter costumes, disseminar hábitos de higiene e saúde, unificar a nação, enfim, moldar uma nova geração esclarecida e produtiva.

Assim, num clima de efervescência política e de entusiasmo pela educação, Armanda iniciou o trabalho em Angra dos Reis, procurando colocar em prática os ensinamentos adquiridos nas leituras de Pestalozzi, Maria Montessori, Dewey, e muitos outros. Na escola ao ar livre, improvisada à sombra de bambus e com mobiliário bem tosco, inspirada na proposta montessoriana, procurava traduzir a ideia de trabalhar a partir dos interesses das crianças.

A breve permanência de Álvaro Alberto da Motta e Silva, seu irmão, no posto para o qual fora designado, interrompeu o trabalho de Armanda que seria mais tarde considerado uma das primeiras experiências pedagógicas de cunho renovador. Ali alicerçou a compreensão que teria sobre o papel da escola: civilizar e assistir as crianças do povo.

Mas, foi na Escola Regional de Meriti, na qual não deveria existir discriminação religiosa, racial, sexual e social, que se legitimou como uma educadora à frente de seu tempo, por suas ideias inovadoras sobre as práticas pedagógicas, contando com muitos colaboradores, desde os primeiros tempos: Edgar Süssekind de Mendonça, Francisco Venâncio Filho, Delgado de Carvalho, Belisário Penna, Heitor Lyra da Silva e Lourenço Filho.

Deles recebeu sugestões de programas, doações, apoio, e, sobretudo, reconhecimento público para prosseguir na missão cívica de educar as crianças do povo. Eles divulgaram o caráter inovador e pioneiro da escola e de sua fundadora, visto que o trabalho desenvolvido era “uma das iniciativas de sentimento mais corajosamente renovador”, constituindo-se em obra de “admirável intenção socializadora”, ou chamando a atenção para o regionalismo como princípio educativo da experiência, pois naquela escola, “não se compreendia ‘a nacionalidade sem que contenha as características de cada região, diretamente ensinada para ser sinceramente compreendida”.

Ana Chrystina Venancio Mignot

(Texto retirado do livro: Armanda Álvaro Alberto – Série Educadores/MEC; p. 54 – 56)

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